quinta-feira, 28 de abril de 2016

OS ACIDENTES ACONTECEM NA NATUREZA

Quando deixo cair uma coisa e ela parte, posso: 1- ficar a olhar para o que aconteceu e culpar-me durante horas e contar aos amigos e culpar-me outra vez; 2 - posso apanhar os cacos (ou tirar uma foto artística para o instagram); 3 - posso tentar culpar outra pessoa pelo que aconteceu (pode demorar mas de certeza que consigo encontrar alguém); 4 - tentar avaliar todas as condicionantes que levaram ao sucedido numa tentativa vã de controlar o próximo; 5 - posso aceitar que as coisas acontecem porque acontecem.

PUMBA! CATRAPÁZ! PIMBA! O mealheiro do Capitão Polo Polar espatifou-se.
Quando o meu filho deixa cair uma coisa e ela parte... fica a olhar para mim. Parado e de olhar frágil, fica à espera da minha reação para ter a dele. São apenas alguns segundos em que um dique segura tudo o que vai dentro dele.
O mealheiro ficou em pedacinhos, aconteceu.
Depois de respirar profundamente umas quantas vezes, tenho uma excelente oportunidade para ensinar ao meu filho uma consequência natural que dá sempre jeito: cai, é frágil, parte-se. Tenho uma oportunidade para reconhecer os sentimentos que ele tem nesse momento ajudando-o a lidar com eles (aumentando a conexão e fomentando a autoestima) e estou na ocasião certa para deixá-lo encontrar sozinho uma solução, por exemplo fazer tarefas em casa para comprar um novo.

Importante, mesmo importante, naquele momento é ajudá-lo a ter jogo de cintura para os reveses da vida. Para quando nos acontecem coisas menos boas que nos apanham de surpresa e aparecem sei lá de onde, conseguirmos não responder com ansiedade ou reatividade emocional mas com presença e aceitação. Aceitá-las como pontos de partida e não destinos fatídicos.

Desde pequenino que lhe digo “os acidentes acontecem na natureza”. Na natureza tudo nasce e cai, floresce e desaparece. Flui e simplesmente é. Quando repetia a frase ao meu filho, toneladas saíam por magia daqueles olhos enquanto ele se levantava e tentava novamente. De cada vez a frase fazia mais sentido e tornava-se mais sua. Dava-lhe força e ajudava-o a levantar-se sem culpa, sem carrego.
No outro dia parti uma coisa, gostava muito dela e ainda estava perdida entre o ponto 1 e 4. Ele veio devagar, colocou os braços à minha volta e disse “Mamã, os acidentes acontecem na natureza”... e pelo caminho ele aprendeu também o que é a empatia.

sexta-feira, 22 de abril de 2016

MAPA DE NAVEGAÇÃO PARA PAIS


Como mãe tenho muitas vezes o momento “e agora o que é que eu faço?”. Surge repentinamente sem avisar e sem deixar muito tempo para pensar sobre o assunto.

Os momentos “e agora o que é que eu faço” surgem quando o nosso filho tem uma birra do tamanho do Pavilhão Atlântico, quando chegamos à cozinha e temos uma instalação moderníssima de farinha e outros ingredientes, biológicos claro, espalhados pelo chão, ou quando simplesmente no dia a dia nos sentimos perdidos.

Na parentalidade consciente, existe uma espécie de mapa que é a nossa base de trabalho enquanto pais e que é definido por cada um: as nossas intenções como pais.
Podemos olhar para as intenções de dois pontos de vista distintos, em relação a nós mesmos (como pais) ou em relação aos nossos filhos, sendo que esta última pode facilmente transformar-se em expectativas.
Porquê intenções e não objectivos? Os objectivos colocam o foco numa meta que pode ser alcançada ou não, a intenção foca no caminho e na aprendizagem, é um processo fluído e constante. Sempre que saímos do caminho podemos voltar a ele relembrando as nossas intenções. É um lembrete do tipo de pais que queremos ser. Se eu sei que tipo de mãe quero ser, consigo definir as minhas ações muito mais facilmente, não só a curto mas a longo prazo. E, em cada momento em vez do “e agora o que é que eu faço?” pergunto “isto está alinhado com as minhas intenções enquanto mãe?”

Mas como é que eu escrevo as minhas intenções? Num momento tranquilo, pegue numa caneta e pense “como gostaria que o meu filho me descrevesse em adulto? Que qualidades, valores e características gostaria de passar ao meu filho? Como gostaria que fosse a nossa relação? Como quero que seja a minha família? Como posso ajudar o meu filho a ser feliz?”
Uma das minhas intenções como mãe é aceitar o meu filho completamente e receber com igual amor os momentos bons e os mais desafiantes.
E aí desse lado, quais são as suas intenções?

quinta-feira, 21 de abril de 2016

OS MENINOS QUE COMEM DEVAGAR VÃO PARA A SALA DOS BEBÉS


Ontem o meu filho chegou a casa a deitar fumo pelas orelhas porque alguém na escola lhe disse “Estás distraído, pareces um bebé!” Ui.
Para mim, se me disserem pareces um bebé, penso logo que os cremes antirrugas funcionam lindamente, que estou com uma pele óptima e com uma aparência fresca e catita. Ou seja, depende do significado e da carga emocional que dou à palavra. Não sei porquê, nos infantários querem tanto que as crianças pequenas façam “coisas de crescidos” que tornaram a palavra “bebé” ofensiva. Representa incapacidade, preguiça, lentidão e inferioridade (o que pode mesmo alterar a forma como uma criança olha para um irmão bebé).
Um bebé é tudo menos isso. É fabuloso! E é assim que os nossos filhos se devem sentir todos os dias, especiais, amados e principalmente aceites.

segunda-feira, 18 de abril de 2016

AS BRINKADËIRAS NÃO DEVEM TER INSTRUÇÕES DO IKEA


“Quando ensina algo a uma criança, tira-lhe para sempre a possibilidade de o descobrir por si própria” Jean Piaget

Nunca gostei de ler instruções. Ainda hoje quando compro um gadget qualquer uso a técnica “Catita”: carregar em tudo até descobrir como funciona. Aprendo rapidamente, descubro coisas para além das instruções e nunca mais me esqueço. De tempos a tempos apanho com um “antes de iniciar o aparelho ligue-o 2 horas à corrente para não ficar permanentemente danificado”. Ups.

Tirando os brinquedos que podem causar alterações planetárias ou no clima mundial, os brinquedos não devem ter instruções parentais. Devem ser uma descoberta, uma oportunidade de expandir a imaginação. Além de que eles provavelmente percebem muito mais do assunto do que nós. Não há uma maneira certa ou errada de brincar. Um carrinho pode ser um submarino ou uma nave espacial. E pintar dentro dos contornos não devia ser a atividade preferida do Dali. Em vez de os ensinarmos a brincar com as coisas, que tal aprendermos com eles a brincar?

quarta-feira, 13 de abril de 2016

COMO DAR CABO DA AUTOCONFIANÇA DE UMA MÃE COM UMA LULA.



“Que lindo!” “Gostas mamã?” “Gosto muito!”- tempo médio da conversa, 10 segundos.
Quando os nossos filhos nos mostram os seus desenhos, muitas vezes obras cubistas/surrealistas, pensamos é agora, tenho de lhe dizer que gosto muito para ele ficar feliz e confiante. Surgem nesse momento duas questões pertinentes. Uma, é a cara de estranheza que a mãe ou o pai está a fazer enquanto tenta perceber que raio representa o desenho e pede a todos os santinhos que o miúdo não lhe faça perguntas sobre a sua obra. A outra é uma tentativa de variação de vocabulário para parecer mais natural “Já disse “bonito” da outra vez... lindo, filho tá liiindo!” Ou seja, o nosso filho percebe que não estamos a ser lá muito sinceros. No entanto, estamos perante um momento extremamente importante em que podemos regar a autoestima da criança ou a sua autoconfiança. Mas não é a mesma coisa? Não. A melhor forma de entendermos é retirando o prefixo “auto” e ficamos com Confiança e Estima. A confiança relaciona-se com uma área específica, é uma aptidão ou um talento, algo que se faz bem (confiança a jogar matraquilhos, a cantar em público ou na aula de matemática), estamos no domínio do fazer.
A autoestima saudável permite-me falhar um golo e lidar bem com isso, é uma espécie de sistema imunitário social e enquadra-se no domínio do ser. Se tenho uma autoestima saudável sinto-me bem comigo e sei quem eu sou.
A autoconfiança cresce com os elogios, prémios e notas boas.
A autoestima cresce quando estou rodeado de pessoas que se preocupam e valorizam o que sinto e penso e que reconhecem as minhas necessidades. Olham para mim, reconhecem-me e respeitam-me como o ser humano único que sou.

Voltando ao nosso desenho, percebemos agora que o “está lindo!” apenas foca na autoconfiança. Será que a criança faz o desenho à espera da nossa validação ou porque lhe apetece mesmo fazer um desenho? Valorizando o processo da criança e mostrando curiosidade pelo que ela fez e como o fez, aumentamos a sua autoestima. “Uauu, Tantas cores! Gostas mesmo de azul! E isto são peixes? Que peixe é este?” “Oh Mãe! Não é um peixe, não tem barbatanas, tontinha. É uma lula vampira como nos octonautas!” tempo médio da conversa, 30 minutos.

A minha autoestima também ficou regada mas a minha autoconfiança em relação a animais marinhos foi pelo cano.

domingo, 10 de abril de 2016

A EMPATIA É BEM MELHOR QUE UMA SANDES DE QUEIJO.

https://www.youtube.com/watch?v=1Evwgu369Jw&nohtml5=False



Ele está triste, mesmo triste. Eu só quero que passe. Tento tudo porque dói que se farta ouvi-lo chorar. Às vezes tento distraí-lo fazendo malabarismos variados e figuras que espero nunca irem parar à net. Pode até sair-me um “Já passou, está tudo bem” ou um “Queres uma sandes de queijo?”. Apesar de doloroso para os pais verem o seu filho em tamanha ebulição emocional, estamos na verdade perante uma oportunidade única de conexão com os nossos filhos.

E o que temos de fazer? Nada. Estar inteira, só ali, naquele sítio escuro com eles.

Ouvir, aceitar, empatizar e mostrar que ter qualquer uma das emoções é natural, as “boas” e as “más”. É tão importante estar triste como estar feliz. E quando estamos tristes temos de respeitar esse sentimento com o mesmo respeito que respeitamos uma grande alegria. Faz tudo parte da nossa humanidade e é assim que aprendemos sobre nós e sobre os outros. Se eu não aceito a minha tristeza, como posso aceitar essa parte de mim? Se a minha mãe não aceita quando estou triste ou zangado como pode gostar dessa parte de mim? É por isso que este momento de vulnerabilidade é especial e permite aceder de uma forma única ao nosso filho e a nós.

“Estás triste? Eu também fico triste muitas vezes. Posso sentar-me ao pé de ti?” é tão mais poderoso que uma sandes de queijo.

quinta-feira, 7 de abril de 2016

COMO FALAS COM O TEU FILHO? E CONTIGO?




Nos próximos dias, presta atenção. Usa uma mente de principiante e aproveita para ver como falas com o teu filho. Repara na tua linguagem corporal quando falas com ele e se o teu corpo está em tensão ou não. Onde estão as tuas mãos? Os braços estão cruzados? Ou numa posição mais receptiva? E o olhar? Ao nível da criança ou uns bons palmos acima?

Começa a tomar consciência, devagar. Sem pressas e principalmente sem julgamentos.

Repara também nos pensamentos que tens sobre ti, aqueles que teimam em voltar e questiona se são mesmo teus.

quarta-feira, 6 de abril de 2016

E TU, O QUE QUERES SER QUANDO FORES GRANDE?


- Bombeiro.
- Médico
- Astronauta.
- Eu quero ser chefe como a minha mãe.
- E tu Joãozinho? O que queres ser?
- Eu quero ser feliz.
- Não compreendes a intenção da pergunta, Joãozinho?
- A Professora é que não compreende a intenção da vida.

Enquanto crescemos vamos juntando papéis ao nosso “eu”. Máscaras que usamos nas diferentes situações sociais e pessoais. Quando questionamos tudo, começamos a fazer o caminho inverso de volta a onde tudo começou, no “eu”.

Como pais, respeitar a autenticidade dos nossos filhos permite-lhes terem espaço e aceitação pelo que eles são, para crescerem ligados ao que realmente sentem, precisam e acreditam. No caminho, com os desafios da parentalidade, temos uma oportunidade única de sermos “eu” outra vez e inspirarmos os nossos filhos com a nossa autenticidade.

terça-feira, 5 de abril de 2016

O INCRÍVEL RAPAZ COM GARRAS NOS PÉS


Guilherme, 4 anos, adora as suas unhas dos pés. São dele, são as suas garras. Na hora de as cortar chora furiosamente de uma forma descontrolada: “não quero, vai doer”. Mesmo depois de perceber pela experiência que não doeu, na vez seguinte ao tentar cortar as unhas tudo se repete.

Respira Mãe Catita.
Começo por deixar de tentar resolver o “problema” e tentar perceber o que está realmente em causa. Estou a respeitar e reconhecer a necessidade do meu filho? O que ele está a tentar comunicar? Respira Catita.

A Parentalidade Consciente usa algumas ferramentas que nos ajudam a perceber melhor as necessidades que os nossos filhos precisam de sentir preenchidas e que muitas vezes ficam perdidas no seu comportamento, que é o maior foco de outras formas de educação.
Um dos métodos que gosto de utilizar é o método LASEr do Pedro Vieira. Este método define 4 cores de personalidades-tipo às quais correspondem necessidades predominantes. Usando o método LASEr, descobri que o meu filho é verde (necessidade de conexão e pertença), vermelho (necessidade de reconhecimento e significância) em situações pontuais é bastante azul (necessidade de segurança e controlo). Neste caso, senti que através da conexão e do reconhecimento da sua opinião poderia encontrar uma forma de lhe dar controlo da situação.

Enquanto ele continua a berrar e a espernear, guardo a tesoura e procuro usar uma linguagem pessoal para comunicar de uma forma consciente com ele. Tento ouvi-lo e não apenas ouvir para arranjar maneira de lhe cortar as unhas.

“Guilherme, a mamã quer falar contigo, já vi que estás muito zangado. Podes olhar para os meus olhos por favor? Gosto de falar contigo quando olhas para mim, assim sei que estás a ver o que estou a sentir e eu também vejo o que tu estás a sentir” (ainda chorar sentou-se ao meu lado, abracei-o).



“ - Vejo que ficas muito zangado e nervoso na altura de cortar as unhas dos pés, não é? Porquê?

-       Vai doer. As unhas são pequeninas, vai doer muito.

-       As das mãos também doem?

-       Não. Estas é que são pequeninas.

-       Hum?! Então o que custa são mesmo as dos pés?

-       Sim...

-       Eu percebo. Também gosto mais de cortar as unhas das mãos.

Eu preciso mesmo de te cortar as unhas dos pés, elas estão muito grandes e podem magoar-te. Fico preocupada por estarem assim tão grandes.

O que achas que podemos fazer para não te custar tanto? Tens alguma ideia?

-       Deixa-me pensar.. Podíamos fazer legos...

-       Boa ideia, assim já não vai doer?

-       E jogar no Ipad! Não mamã, assim não. Assim é cósmico.

Durante a comunicação consciente procurei reconhecer o que ele estava a sentir, confirmar esse sentimento e dar espaço e apoio para ele encontrar a sua solução.

É mais fácil agarramo-nos ao pensamento que julga ”que disparate, agora tem medo de cortar as unhas dos pés” ou ao “cortas e acabou a choradeira”.
É mais desafiante sentir porque é que me incomoda ele não fazer o que eu quero. Questionar a diferença entre o que quero e qual a minha intenção. Aceitar que o Guilherme é uma pessoa inteira, com o mesmo valor que eu e cujas emoções são tão válidas e importantes quanto as minhas.
É preciso largar o saco, este saco pesado que carregamos cheio de expectativas e pensamentos que muitas vezes nem eram nossos e que já não nos servem nem devem passar para os nossos filhos.
Aceitar. Eu também tenho medo. E gostava mesmo que me tivessem perguntado “O que achas que podemos fazer para não te custar tanto? Tens alguma ideia?” ...sabia tão bem essa pergunta. Sabia a “Eu vejo-te”, a “eu estou aqui contigo e gosto muito de ti como tu és, com todos os teus medos e emoções”. A sentir que a minha integridade física é importante, e que o meu corpo é meu até à pontinha das unhas dos pés.
Através desta situação, tive a oportunidade maravilhosa de conhecer mais um pouco o meu filho, de regar a sua autoestima, de aumentar a nossa ligação e confiança. De usar a minha mente de principiante para olhar pela primeira vez para a situação de cortar as unhas dos pés e o meu detective-mamã para descobrir as necessidades em falta. Percebi que ele tem uma grande necessidade de pertencer em todos os processos, de ser ouvido, de ter algo a dizer para se conseguir sentir seguro.
É incrível o meu rapaz com garras nos pés.